Os bancos da catequese, lá no salão paroquial da minha freguesia, já lá vão. As salas exíguas, onde não havia lugar para todos, onde outrora passava as tardes de Sábado, onde dizia a plenos pulmões "eu tenho um amigo que me ama", já não contam com a minha presença.
Arrumei os livros, após dez anos de percurso ao mais alto nível, a dar trabalho ao hipotálamo, por sentir que a minha viagem tinha terminado. Tinha feito o Crisma!
Dois anos se passaram. Mas será que, após a conclusão da minha vida académica espiritual, fiquei um bom profissional?
Tenho as minhas dúvidas. Agora com Bolonha talvez faça um mestrado, não vá o Diabo tecê-las... Longe vão os tempos em que com uma simples licenciatura se conseguia ficar vinculado a um qualquer Deus, ao patrão do céu (seja ele onde for). Nos dias que correm, após a conclusão do curso, apenas uma minoria consegue colocação imediata, submetendo-se a qualquer tipo credo que possa aparecer. É aí que têm ganho cada vez mais relevo os cursos profissionais e mesmo os institutos politécnicos, cativando cada vez mais fiéis (perdão, estudantes...). Tal caso é o do IPTJ, Instituto Português das Testemunhas de Jeová, bem como de muitas outras escolas que vão ganhando progressivamente expressão e prestígio.
A praxe, como sempre, não reúne consensos, seja qual for o estabelecimento de ensino. Desde longas horas passadas de joelhos -a posição natural do caloiro- no bafiento confessionário, a fastidiosas sessões ao Domingo, que não raras vezes usurpam a hora de almoço, ou ainda actividades nocturnas em ambientes sinistros, com velas omnipresentes e cânticos obscuros. Não há como lhes escapar sob pena de ver a integração no meio comprometida.
Encontramos, como é óbvio, aqueles que levam a praxe demasiado a sério. Caloiros tão dedicados que dão a vida in nominem solenissima praxis, um fenómeno frequente nas faculdades do polo universitário do médio Oriente.
O manual adoptado ao longo do meu curso foi apenas um: a Biblia. Obra de tal modo extensa que se subdivide em duas grandes partes cronologicamente divididas. Contudo, o seu teor marcadamente metafórico torna ininteligível o seu conteúdo, sobretudo sendo eu um comum mortal. Motivo mais que suficiente para estudar por sebentas, os Catecismos ou, vulgarmente, "livros de doutrina".
Estes compêndios da Sagrada Escritura fornecem um auxiliar precioso para aqueles que pretendem concluir o curso. Para facilitar, incluem imagens e todas as palavras necessárias para nos dirigirmos cordialmente ao "Deus Pai"... Pai da ciência em questão. Contudo, outras publicações surgem, verdadeiras obras-primas redigidas por autênticos profissionais, dirigidas para outras áreas do saber. É o caso da revista "Despertai", que tem sido distribuida por meios menos convencionais, mas que vai ganhando seguidores de todas os sectores de especialização.
O meu percurso académico, como disse, já terminou. Serei eu um bom profissional? Provavelmente não. Quando sou chamado para a habitual rotina do trabalho, aqueles rituais sobejamente conhecidos que nos ocupam uma hora por semana (ou mais), procedo sempre de modo mecânico, acriticamente e sem inovar nos métodos. Falta-me gosto? Talvez... Será um problema ao nível da estrutura do ensino superior? Provavelmente sim.
Seja qual for a resposta exacta, duma coisa estou certo. Os recém-licenciados deixam sempre o trabalho, invariávelmente, com um pesaroso "graças a Deus", sabendo de antemão que o dia seguinte será igual... e igualmente indefinido.
o apóstata
Há 3 dias
4 Comments:
permite-me q te corrija: "Agora com Bolonha talvez faça um mestrado, não vá o Santo Papa (entenda-se Exmo. Reitor da UP) dizer aquando do teu ingresso na vida académica que o teu curso não terá futuro nem qualquer saída profissional..."
saudações flupenses ;)
És grande Guimarães...
Que post!
Amen.
sem palavras..
demasiado grande, muito grande Guimarães!..
aquele abraço
tens cara de quem gosta de Boris Vian, oub lá :)
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